JULIANA CUNHA
O caminho de volta pode gerar depressão. É a "síndrome do regresso", termo cunhado pelo neuropsiquiatra Décio Nakagawa para designar certo "jet lag espiritual" que aflige ex-imigrantes.
Morto em 2011, Nakagawa estudava a frustração de brasileiros que voltavam ao país após uma temporada de trabalho em fábricas japonesas.
BONDE ANDANDO
Silvia Zamboni - 27.fev.12/Folhapress | ||
O gerente de marketing Rafael Marques, 33, no centro de São Paulo |
Se ao sair do país o imigrante se cerca de cuidados para amenizar o choque cultural, no retorno a ilusão é de que basta descer do avião para se sentir em casa.
"Retornar é uma nova imigração", diz a psicoterapeuta Sylvia Dantas, coordenadora do projeto de Orientação Intercultural da Unifesp. "A sensação é de que perdemos o bonde, estamos por fora do que deveríamos conhecer como a palma da mão."
Quando voltou do segundo intercâmbio no Canadá, o gerente de marketing Rafael Marques, 33, descobriu que havia ficado para tio: "Todos os meus amigos estavam casados, com outras prioridades. Demorei meses para me situar". Resultado: deprimiu. Recuperado, hoje ele trabalha com intercâmbios.
Para amenizar o estranhamento, a analista de marketing Natasha Pinassi, 34, se refugiou nos amigos feitos durante sua vivência de um ano na Austrália: "Em pouco tempo no Brasil percebi que deveria ter feito minha vida na Austrália. Já não via graça nas pessoas e nos lugares que frequentava antes. Só conversava com brasileiros que conheci no exterior".
A família pouco ajudava: "Não pude falar o que sentia. Eu me culpava por estar sofrendo enquanto meus pais estavam felizes com minha volta", diz Natasha, que tomou antidepressivos para tentar sair desse estado.
A síndrome não é exclusividade dos brasileiros. "Em minhas pesquisas com imigrantes, percebi um sentimento geral de que o país deixado não é o mesmo na volta", diz Caroline Freitas, professora de antropologia da Faculdade Santa Marcelina. "Um português me disse não querer voltar por saber que Portugal já não estaria lá."
ABANDONO
Quem sofre de síndrome do regresso é frequentemente considerado esnobe. Parentes e amigos têm pouca paciência com quem volta reclamando: "O retorno tem uma significação para aquele que ficou. Junto com saudade, há um sentimento inconsciente de abandono, ressentimento e de inveja daquele que se aventurou", explica Dantas.
Para Nakagawa, amigos costumam simplificar o processo de reintegração: "Há uma pressão para que a pessoa 'se divirta'. Na melhor das intenções, os amigos não respeitam o tempo do viajante".
Se a família também não ajudar, o ideal é procurar um psicólogo com formação intercultural. Em São Paulo, o núcleo intercultural da Unifesp dá orientação gratuita.
Título original: De volta ao país, brasileiros sofrem 'síndrome do regresso'.
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